Milton Mendes defende estudos e aprendizagem na Europa
Alexandre Praetzel
O futebol brasileiro entrou em debate sobre a capacidade dos técnicos. Alguns ex-jogadores acham que a competência pode vir pela experiência e vivência na carreira. Outros entendem que o estudo de outros treinamentos e formas de atuar é importantíssimo para a afirmação de um profissional. Milton Mendes encaixa-se no segundo grupo. Em entrevista exclusiva ao blog, Milton defende novas ideias e aprendizados na Europa, onde tem residência, desde 1987. Leia abaixo.
Pouco tempo nos times
“Não penso que tenha ficado pouco tempo nos clubes. Se você perceber o meu currículo, verá que eu tenho feito trabalhos bons e com bom prazo, como no Paraná, onde saí por conta das dificuldades financeiras. Mas nos demais, como Ferroviária, Atlético-PR e Santa Cruz, tive trabalhos importantes e com conquistas. Ficamos por períodos normais para o padrão brasileiro diante das dificuldades de cada clube. Assim é o futebol no Brasil. Por ordem natural das coisas, houve trocas, mas só vejo como trabalho mais curto o do Japão, já que realmente não consegui uma boa adaptação. Portanto, as trocas são normais, apesar de não concordar e ter projeto para pelo menos, dois anos. Mas no Brasil é mais complicado, Penso que a mentalidade dos diretores está mudando e logo teremos clubes que conseguirão levar até a maturidade plena, um projeto a médio e longo prazo”.
Modelo de jogo
“Você não pode taxar um modelo. Isso vai pelos jogadores que tens. Eu prefiro o 4-2-3-1. É um esquema de muitas variantes e que pode fazer com que o modelo mude dentro do jogo, conforme o adversário. Este é o que eu mais gosto, mas é utópico sem conhecer o elenco, as opções nas categorias de base. O clube precisa apresentar os seus objetivos e analisar se as condições que oferecem são compatíveis. A partir daí, organizar-se e cumprir as etapas necessárias para se alcançar os objetivos propostos”.
Qual o grupo de técnicos onde se encaixas
“Me coloco no grupo de técnicos que estuda e gosta de auxiliar e ver o progresso dos atletas, equipe e Clube. Gosto que meus atletas saibam e entendam o porquê de cada treino, seus deveres táticos, para que possam cumprir suas funções baseados não em ordens e sim em entendimento da parte tática individual e da equipe. Me considero um técnico preparado para o diálogo e que evolui em cada trabalho que fiz. Quero dar o melhor para o futebol e penso estar numa condição de igualdade com todos, tendo ideias e conceitos europeus (onde fui formado), mas sem esquecer a realidade brasileira. Prática a teoria se completam e sou desta opinião sempre”.
Técnico brasileiro está desatualizado
“Não penso que esteja desatualizado. Acha que falta oportunidade ao treinador brasileiro de ver novos cenários. Eu tenho contato de gente diferente, estando aqui na Europa, posso sempre trocar experiências. Estou para ir ao Monaco do treinador Leonardo Jardim e aprendi muito também com profissionais no Japão. São todos capazes, mas nosso curso de treinadores no Brasil precisa melhorar e dar legitimidade aos que estudam. Isso fará com que nossos treinadores se aperfeiçoem, já que na maioria são todos muito bons. Vendo novas metodologias e experiências, todos evoluem”.
Projeção para 2017
“Quero estar num clube que me possibilite colocar em prática um trabalho moderno, integrado e apoiado por todo o departamento de futebol profissional do clube. Que priorize a formatação e estabilização de um modelo de jogo e suas variantes, a ascensão e afirmação de jovens valores das categorias de base. Obviamente que estes objetivos estão diretamente ligados a três fatores:
– Planejamento coerente com a realidade do clube;
– Cumprir à risca o planejamento;
– Ter o tempo de acordo com o planejado para se alcançar os objetivos propostos.
Estes seriam sonhos para meu futuro clube.
Metodologia de trabalho
“Tenho como objetivo construir uma relação sólida com os atletas baseada em confiança e respeito mútuo, formando um grupo forte e participativo. Quero ter e proporcionar a todos os atletas do grupo, novos conhecimentos e experiências que sejam marcantes e importantes para o crescimento profissional de cada um. Considero fundamental ouvir e estimular o diálogo com todos porque sempre será mais fácil e rápido implantar uma metodologia de trabalho com sucesso, tendo total apoio e entendimento das obrigações, deveres e direitos de cada atleta e integrantes da comissão técnica. Cito como exemplo o depoimento de um atleta do Santa Cruz, que disse que voltou a ter vontade de jogar futebol porque tinha liberdade para participar e auxiliar nas decisões, entendendo e aceitando bem o que era trabalhado nos treinamentos, possibilitando um melhor desempenho nos jogos”.
Residência na Europa
“Resido na Europa desde 1987. Encerrei lá minha carreira de atleta e iniciei a de treinador. Sempre que tenho um intervalo no trabalho entre um clube e outro, procuro recarregar as baterias, trocar experiências, observar jogos e treinos de vários clubes em diversos países, buscando me atualizar com profissionais que trabalham com diversas metodologias, o que me permite extrair muitas novas ideias para adaptar a realidade do meu próximo trabalho, sempre buscando melhorias. Também penso ser importante ter um comparativo do nível em que me encontro em relação ao que vem sendo trabalhado nos principais centros de futebol do mundo, conhecer estruturas dos CTs. Exemplifico através do recente estágio que fiz com Jorge Jesus no Sporting de Lisboa, visita que farei na próxima semana para conhecer estruturas de dois clubes chilenos, assistir treinos e jogos, além de projetos para estar acompanhando Leonardo Jardim no Mônaco e Diego Simeone no Atlético de Madrid”.
Milton Mendes está com 51 anos. Encerrou sua carreira como jogador em 2000 e tornou-se treinador no mesmo ano. Em 2016, comandou o Santa Cruz, conquistando o Campeonato Estadual e a Copa do Nordeste.